Opinião

Do vaso sanitário ao Atlântico: a espera de um inesperado reencontro

Por Eduardo Ritter
Professor do Centro de Letras e Comunicação da UFPel
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Não sou muito de telenovelas. Já assisti algumas em um passado longínquo. Mas, dia desses, acompanhando a um jogo do Mundial de Clubes na Globo, ouvi o narrador dizendo que em uma das novelas que está rolando, parece que iriam descobrir que Fulano ou Fulana não estava morto(a) e que reapareceria após não sei quantos anos. Rapidamente lembrei de algumas novelas que assisti, em que a técnica da falsa morte foi utilizada. Na mais famosa, se não estou enganado, Roque Santeiro morre e depois reaparece em carne e osso. Mais recentemente, já neste século, em Da cor do pecado, algum personagem também reaparece anos depois de ser declarado morto, mas não lembro bem o nome do sujeito. E, em Quatro por quatro, nos anos 1990, tenho uma vaga lembrança de que acontece algo parecido com uma mulher (seria esposa do Bruno?). Não lembro, não lembro. E não vou ser um cronista trapaceiro indo pesquisar no Google... Perderia totalmente a graça e me sentiria um impostor diante do bom coração do querido(a) leitor(a).

Falando sobre isso, estou com esperanças de um reencontro. Mas não queria que demorasse anos, como nessas telenovelas. Vou contar brevemente o meu causo. Eis que esses dias eu saí de carro vestindo um calção que não tinha bolsos. Na volta, cheguei apertado para ir ao banheiro e a chave estava pendurada no elástico do calção. Pois abri primeiro o portão, depois a porta da casa e, depois, a do banheiro, e imediatamente descarreguei tudo na privada. Sei que é difícil de acreditar, mas juro pela alma do meu falecido cachorrinho Jimbo (que viveu comigo 16 anos na infância e adolescência), que exatamente no mesmo momento em que puxei a descarga, a p... da chave do carro caiu lá dentro da privada. Eu fiquei olhando a água girando, girando e girando e, naqueles curtos segundos, perguntei, de mim para mim: enfiar a mão ou não enfiar? Optei por esperar, pois imaginei que a chave não passaria no cano ou voltaria devido ao seu peso. Mas que nada, a desgraçada se foi para o ralo.

Depois do ocorrido, decidi esperar. Interditei o banheiro, não deixando ninguém usar o vaso sanitário e, muito menos, usar a descarga. Eu tinha esperança de que ela voltasse, apesar de imaginar o seu fim trágico. Assim, já faz alguns dias que estou angustiado, aguardando o seu retorno. O pior foi que dia desses, veio um encanador tratar de outro assunto e contei meu drama. Ele fuçou no vaso, mexeu, deu descarga e decretou: "É, meu amigo, é melhor comprar uma chave nova". Para a minha sorte, eu tinha uma reserva, mas que não é a mesma coisa que a original. Fiquei encucado com o destino trágico da minha chavezinha querida.

Daqui alguns dias vou para o litoral norte. Espero que, assim como os personagens que receberam de volta Roque Santeiro, eu possa estar caminhando pela beira do mar e, de repente, tropeçar na minha chavezinha que, vá saber, saiu do esgoto de Pelotas, pegou a Lagoa dos Patos e foi despejada no Atlântico. Só torço para que seja agora ao invés de levar os dez, 15 ou 20 anos para nosso feliz reencontro.

Bom, são devaneios após um ano de muito trabalho e transformações. Acho que estou cansado. Por isso, meus amigos e amigas, estou saindo de férias. Volto a escrever novamente aqui a partir de fevereiro. Enquanto isso, desejo a cada um, um excelente Natal, ano novo e carnaval. Afinal, vá saber se lá pelo fim de uma noitada de carnaval eu não vou em algum banheiro qualquer e me deparo com a já saudosa chave original do meu simples e humilde carrinho.

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